sexta-feira, setembro 29, 2006
Eleição 2006
JC OnLine
Conversas desencontradas na rua, spams na internet e muita desinformação, inclusive, entre profissionais da área jurídica. Esses três ingredientes provocaram uma grande confusão na cabeça dos eleitores menos atentos que acabaram acreditando na idéia errônea de que uma grande quantidade de votos nulos ou brancos poderiam anular a eleição. "Isso é uma lenda. Tanto o voto nulo quanto o voto branco servem apenas para fins estatísticos, para saber talvez o grau de resignação da população, mas em termos de possibilidade de nova eleição, de forma alguma", enfatizou o diretor geral do Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco (TRE-PE), André Pegado. O próprio ministro Marco Aurélio, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), se pronunciou oficialmente no início deste mês na tentativa de dirimir qualquer dúvida sobre o assunto. "Temos que interpretar a lei à luz da Constituição. Será eleito aquele que obtiver - considerando os votos válidos, afastando os votos nulos e brancos -, mais de 50% dos votos", ressaltou. [áudio]
A cada período eleitoral essas dúvidas voltam à tona e nunca é demais repetir: os votos brancos e nulos são subtraídos de todos os cálculos para a totalização dos resultados. As interpretações equivocadas podem estar acontecendo pela combinação do uso de palavras com mesma raiz (nulo e anulação) no Código Eleitoral (Lei Nº 4337). O artigo 224 fala que "Se a nulidade atingir a mais de metade dos votos do país nas eleições presidenciais, do Estado nas eleições federais e estaduais ou do município nas eleições municipais, julgar-se-ão prejudicadas as demais votações e o Tribunal do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias". Os artigos 220, 221 e 222 também falam em anulação de votação, mas se referem a falsa identidade, obstrução da fiscalização e outros atos que comprometam a legalidade do pleito. Em nenhum momento se fala em voto nulo.
Sendo assim, os votos anulados pelo eleitor, por vontade própria ou por erro, não se confundem com os votos anulados pela Justiça Eleitoral em decorrência de atos ilícitos. "O TSE já teve entendimento de que o caso de anulação da eleição só ocorre quando houver fraude. Com a urna eletrônica não há possibilidade de fraude. Só se for comprovado manipulação, por exemplo, de um candidato que comprou mais de 50% dos votos. Para a população, na prática, o voto nulo é um voto inóquo porque se você não vota, vai possibilitar ainda mais que os candidatos que não aprova sejam eleitos", disse André Pegado.
O comerciante Fernando Cabral, 45 anos, discorda. Ele, assim como alguns eleitores, acredita que o voto nulo e o voto branco podem ser encarados como voto de protesto. "Imagine se mais da metade das pessoas votassem nulo ou branco. Seria uma verdadeira sacudida nas estruturas do sistema ao qual vivemos", defendeu. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Secção de Pernambuco (OAB-PE), Júlio Oliveira, acredita que o voto nulo não pode ser considerado um instrumento de mudança. "Por mais que seja intencional e em tom de protesto, votar nulo é concordar com tudo o que está acontecendo atualmente. É omissão de ser cidadão", endureceu. Junto com o Sindicato dos Jornalistas de Pernambuco (SinjoPE), a entidade lançou esta semana uma campanha de conscientização dos eleitores. [saiba mais aqui]
Para o cientista político Hely Ferreira, professor e membro do Núcleo de Estudos Eleitorais e Partidários da UFPE, a melhor forma do eleitor reivindicar seus direitos e demonstrar sua indignação frente à corrupção na política é acompanhando a classe. "Os parlamentares fazem o que querem; mudam de partido a toda hora; votam a favor em projetos que não são importantes para a população e contra os que são, sem que a sociedade se dê conta disso". Hely acredita que a população brasileira não está acostumada a discutir o tema com maior profundidade e, por isso, não sabe valorizar o seu voto. Segundo pesquisa realizada pela UFPE e Faculdade Maurício de Nassau e divulgada em julho deste ano, 90% dos eleitores recifenses não lembram em quem votoram para deputado estadual há quatro anos. Nacionalmente, esse percentual sobe para 72%, segundo o Datafolha. "O cenário atual também é triste. A população, que já tem pouco interesse pela política, recebe apenas informações negativas pelos meios de comunicação", lamentou.
"Em situação de crítica extremada e completa descrença é melhor para a democracia escolher o melhor candidato entre os piores. Se desejam de fato mudar, tem que escolher os candidatos mais comprometidos", ressaltou o presidente da OAB-PE. A seleção, segundo o cientista político Hely Ferreira, passa em acompanhar a vida dos políticos antes e, principalmente, depois das eleições. "É preciso saber quem está envolvido em corrupção e quem está comparecendo ao trabalho. Existe uma idéia equivocada de que não existe político honesto. Existe sim, mas tem que procurar". O diretor geral do TRE-PE, André Pegado, aposta nos meios de comunicação como auxiliar dos eleitores na busca por dados sobre os candidatos. "Atualmente, as informações estão disponíveis para todos, seja pela TV, internet ou rádio". E completa: "O grande problema nosso é que só discutimos política no calor da campanha eleitoral. O eleitor reclama da situação, mas tem um grau de responsabilidade muito grande nesse quesito da escolha. Como diz o ministro Marco Aurélio: nós somos os empregadores dos nossos governantes."
O TSE decidiu enfatizar o combate ao voto nulo na campanha Vota Brasil deste ano. Com o slogan 'Pense e Vote - o Brasil está nas suas mãos', a campanha, composta por 32 filmes e 32 spots de rádio, tentou despertar no eleitor a importância do voto como um ato de decisão. Neste domingo (1/10), os brasileiros darão a resposta nas urnas.